Estou chegando com a viola
E com a garganta pra cantar
Quem topar um desafio
Pegue a sanfona e vem pelear
Pois nas trovas sou de brio
Abato quem duvidar
Muito bem seu foratateiro
Estou aqui pra te ensinar
Como o povo desta terra
A sanfona sabe usar
E não tememos violeiro
Que só saiba gargantear
Que eu só saiba gargantear
É uma calúnia meu amigo
Vou então me apresentar
Pra haver respeito comigo
Sou um homem popular
Um vereador, um homem lido
Me desculpe seu doutor
Se ofendi vossa excelência
Mas pra um bom trovador
Não existem reverências
Cá em nosso acampamento
Lutamos pela sobrevivência
Pois então que saibam todos
Que estou aqui pra ajudar
Em tudo o que for justo
Podem comigo contar
Mas sem passo muito largo
Pro fundilho não rasgar
Pro fundilho não rasgar
Não é preciso tanto esforço
Tal é o jeito que andamos
Maltrapilhos, puro osso
Pro Doutor nos ajudar
Tem é que sofrer conosco
Sofro sem damagogia
A dor do povo que me elegeu
Mas não façam uma orgia
Com a desgraça que se abateu
E quem quiser tirar do povo
Saiba que o povo sou eu!
Mas se és povo de fato
Deve lhe ferir também
Ver um chão sofrer mal trato
E uma nação não ter vintém
Ver tantos colonos sem terras
E tantas terras sem ninguém
Tantas terras sem ninguém
É o que trago em minha manga
Para oferecer pra todos
Quase de graça, feito changa
Só não aceitam os tolos
Estes devem puxar canga
Preferimos puxar canga
Já posso ir lhe adiantando
Do que sair do Rio Grande
E noutros prados andar rolando
Pois não há changa que abrande
A saudade guapa incendiando
Preferem saudade ou fome?
É a questão que têm agora
Mato Grosso é Brasil
E povoá-lo é o que se implora
A todo o bom brasileiro
Que ame, honre-o ou vá-se embora!
É por amor que temos honra
Para aturar tanta miséria
Nossos braços explorados
Querem um pouco desta féria
Mato Grosso é Brasil
Mas o abandono é coisa séria
Não terá abandono, é certo
Temos um bom plano pronto
Vamos conferir de perto
Nossa força vale tanto
Terão uma cooperativa
Que os protegerá feito um santo
Parece mais cobra mandada
O nosso amigo vereador
Rastejando entre as palavras
Arma o bote traidor
Mas quem tem medo de cobra?
Sou gaúcho lavrador!
Não poso crer que um lavrador
Fique aqui em Nonoai, no acampamento
Vendo de braços cruzados
Sua família ao relento
Mas quem for trabalhador
Venha comigo, que eu agüento!
Vamos então explicar
O Doutor não entendeu nada
Nós queremos trabalhar
No arado e na enxada
Só não vamos sustentar
Mais essa sua cambada!
Vou então me despedindo
Muito triste meus patrícios
Por ver forças ocultas
Orientando o vosso ofício
Mas pensem na minha proposta
Não tornem vãos seus sacrifícios
Não será vã nossa luta
Mesmo sem haver a vitória
Lutamos pelo direito à terra
Nossa causa é a nossa glória
E não faltarão seguidores
Para continuarem a nossa história.
QO/1982