CICLOS DO NOSSO ENCONTRO

De Ruiva Aurora, da paixão ardente
Que rompeu iluminando os meus dias
Energizando de sentido as coisas simples da vida
E alegrando o ser e estar no aqui e agora...

De tábua de salvação, na qual me agarrei
Para emergir do tédio e da  náusea poética
Pretendendo sobreviver à deriva de álibis forjados
Agarrado à realidade excitante do teu corpo...

De bolha da paixão, onde nos ilhamos do mundo
E tememos sair da praia com o nosso amor
Ao vermos tantos afundarem  no mar...e haja mar...

De sereia, em cujo canto me encantei
Com medo que fosses uma baleia enfeitiçada...

De rubra Vênus sobre o meu Marte moreno
Levitando como estrela na mágica vara de condão
Trilhamos o caminho da sábia cura kármica

De urubuservadores, nos momentos mais difíceis
Não viramos a mesa nem devolvemos as chaves
Guiados pelo fresquinho macio do tesão que nos une
Fizemos infindáveis ensaios prazerosos de despedidas

De dramas, da dor presumida de uma gaiola vazia
De crises, de rituais de um amor cego vivendo de orgasmos

Oh!  Luz da Aurora Ruiva que rompeu!
Que dá sentido a tudo o que se viveu, vive e viverá.
De ciclo em ciclo vamos serenando o nosso amor.

                                                                                                                                                                              I/2005

BELCHIANAS

Das coisas que aprendi nos discos
Quanto rock dando toque, tanto blues
Não estou interessado em nenhuma teoria
Eu sou apenas um rapaz latino-americano
Um tango argentino me vai bem melhor que um blues
Estou muito cansado do peso da minha cabeça
O dedo em V, cabelo ao vento, amor e flor, velho cartaz
Na parede da memória esta lembrança é o quadro que dói mais
E nas paralelas dos pneus n’água das ruas
Levar a saudade na camisa toda suja de batom
O passado é uma roupa que não nos serve mais
Você não sente nem vê mas eu não posso deixar de dizer
Ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais
Desesperadamente eu grito em português
Tenho vinte e cinco anos de sonho e de sangue e de América do Sul
E eu quero é que esse canto torto feito faca, corte a carne de vocês
A minha alucinação é suportar o dia-a-dia
Os humilhados do parque com os seus jornais
E a solidão das pessoas dessas capitais
Longe o profeta do terror que a laranja mecânica anuncia
Amar e mudar as coisas me interessa mais
A vida realmente é diferente, quer dizer, ao vivo é muito pior
Enquanto houver espaço, corpo e tempo
e algum modo de dizer não eu canto
Viver a divina comédia humana onde nada é eterno
O fim do termo "saudade"como o charme brasileiro
Quando você entrou em mim como o Sol num quintal
Ainda sou estudante da vida que eu quero dar
De lágrimas nos olhos de ler o Pessoa e de ver o verde da cana
Foi por medo de avião aquele toque Beatle
John, eu não esqueço, a felicidade é uma arma quente
Veloso, o sol não é tão bonito pra quem vem do norte e vai viver na rua
O que é que pode fazer o homem comum neste presente instante senão sangrar?
O que é que eu posso fazer um simples cantador das coisas do porão?
Fique você com a mente positiva que eu quero é a voz ativa (ela é que é uma boa!)
Saia do meu caminho, eu prefiro andar sozinho
Deixem que eu decido a minha vida
No fundo do prato, comida e tristeza
Eu tenho medo e medo está por fora
Eu tenho medo um Rio, um Porto Alegre, um Recife
E a única forma que pode ser norma é nenhuma regra ter
Não quero o que a cabeça pensa eu quero o que a alma deseja
O meu coração selvagem tem essa pressa de viver
Esse negócio de amor já não se faz sem punhais
Esconda um beijo pra mim sob as dobras do blusão
Não vendi a alma ao diabo... O diabo viu mau negócio nisso de comprar a minha
Com a mesma dura ternura que aprendi na estrada e em Che
Eu era alegre como um rio, um bicho, um bando de pardais
Mas veio o tempo negro e a força fez comigo o mal que a força sempre faz
Pra que mentir de fingidor das dores tão reais
Eles venceram e o sinal está fechado pra nós
Eu quero meu corpo bem livre do peso inútil da alma
Ano passado eu morri mas esse ano eu não morro.

+30/04/2017