INVERNADA

Sem melodrama
Visto meu velho pijama
E me encolho
No quentinho da minha cama
Pra ver a neve...
Sem reclamar
Deste  frio de encarangar
Que faz aqui no Sul do Mundo
Onde nasci: é o meu lugar!


(M/2013)

Falso Brilhante


Com alma primitiva culturizada

tenho a rudeza do diamante bruto

sem assimilar os trejeitos da socyte

vou tropeçando pelos salões

até virar seixo rolado

em um anel de brilhante lapidado

que não puxa fio da meia de ninguém.


(P/1996)

Mercado Público: Evolução das Espécies


Poema de 1996, quando foi manchete de jornal um grupo de menores que moravam num bueiro em frente ao Mercado Público, às vésperas dele ganhar a atual cobertura metálica (parte que não queimou no incêndio), e espantar os gatos dos seus telhados:
Pelos bueiros escoam crianças
pivetes do submundo literal
enquanto no mercado público
os ratos foragidos dos bueiros
vêem os gatos, seus predadores naturais
desenvolvendo adaptação na busca do sol
diante de uma moderna cobertura evoluída
que devolverá os altos-do-mercado
ao convívio dos homens...
Por sua vez, as pombas
que moram do outro lado da rua
em equilíbrio com o mercado e seus cereais
comem pipocas nas mãos das crianças
e estão voando e cagando na cabeça dos homens.

CAPACHO VELHO

Como um peludo tapete branco
De pele de urso com  cabeça
Estendido sob os pés do poder perverso
Do capitalismo politicamente incorreto
Que faz riquezas cavando buracos
Na camada de ozônio do planeta
Fico escutando as conversações e acordos
Das cúpulas das poderosas nações desunidas
Sobre a proteção da natureza
Do meio ambiente e da pobreza
Sob a névoa da fumaça dos charutos transgênicos
Expelidas das chaminés poluentes de suas narinas...
 Imobilizado, não consigo puxar-lhes o tapete
Nem um abraço de urso, nem um urro forte
Nada mais tenho para os ameaçar
Sou mais um velho capacho, sem esperança
De fazer ou ver o mundo melhorar.

                                                                       (I/2007)